Entrevista FHC

Ontem o JN da rede Globo trouxe trechos de uma entrevista coletiva do (ex)presidente Lula ao lado da futura presidente Dilma, entre as muitas bobagens que ele disse eu fiquei pensando na diferença de nível entre ele e FHC que também deu uma entrevista essa semana, mas ao jornal Folha de São Paulo, e como todo mundo sabe sou fã do tucano e reproduzo a mesma aqui.



Folha - José Serra aproveitou a oportunidade do segundo turno como deveria?
Serra foi fiel ao estilo dele. Tomou as decisões na campanha, com o [marqueteiro Luiz] Gonzalez. Não fez diferente do que se esperaria de Serra como um candidato que define uma linha e vai em frente. O PSDB, e não o Serra, tem outros problemas mais complicados. Precisa ter uma linguagem que expresse o coletivo.
Os candidatos esqueceram a campanha e não definiram o futuro. O nosso futuro vai ser fornecer produtos primários? Ou vamos desenvolver inovação, a educação, a industrialização? Isso não foi posto.

O governo Lula patrocina a formação de grandes empresas, uma espécie de complexo "industrial-burocrático". Qual a diferença para o seu governo, que também usou o BNDES nas privatizações?
Tudo é uma questão de medida. Os fundos [de pensão] entraram na privatização porque já tinham ações nas teles e participar do grupo de controle lhes dava vantagem. Mas tive sempre o cuidado da diversificação.
O problema agora é de gigantismo de uns poucos grupos, nesse complexo, que na verdade é sindical-burocrático-industrial, com forte orientação de escolher os vencedores. Isso é arriscado do ponto de vista político e leva ao protecionismo.

A fila do PSDB andou? Chegou a vez de Aécio Neves para presidente?
Eu não posso dizer que passou a primeiro lugar, mas que o Aécio se saiu bem nessa campanha, se saiu. Não posso dizer que passou a primeiro lugar porque o Serra mostrou persistência e teve um desempenho razoável.
Não diria que existe um candidato que diga "Eu naturalmente serei". Mas o PSDB também não pode ficar enrolando até o final para saber se é A, B, C ou D. Dentro de dois anos temos de decidir quem é esse "é" e tem de ser de todo mundo, tem de ser coletivo.
Não estou disposto mais a dar endosso a um PSDB que não defenda a sua história. Tem limites para isso, porque não dá certo. Tem de defender o que nós fizemos. A privatização das teles foi boa para o povo, para o Tesouro e para o país. Do ponto de vista econômico, as questões estão bem encaminhadas. O problema não é saber se a economia vai crescer, é se a sociedade vai ser melhor.

Houve sinais do que o sr. chama de "espírito" da democracia no processo eleitoral?
Não vejo. O presidente Lula desrespeitou a lei abundantemente. Na cultura política, regredimos. Não digo do lado da mecânica institucional - a eleição foi limpa. Mas na cultura política, demos um passo para trás, no caso do comportamento [de Lula] e da aceitação da transgressão, como se fosse banal.
Aqui ocorre outra confusão: pensar que democracia é simplesmente fazer as condições de vida melhorarem. Ela é também, mas não se esqueça que ditaduras fazem isso mais depressa.

Como o sr. vê a volta de temas como religião na campanha?
Com preocupação. O Estado é laico, e trazer a questão religiosa para o primeiro plano não ajuda.

A dose dos marqueteiros nas campanhas está exagerada?
Sim, em todas as campanhas. Nós entramos num marquetismo perigoso, que despolitiza. Hoje a campanha faz pesquisas e vê o que a população quer naquele momento. A população sempre quer educação, saúde e segurança, e então você organiza tudo em termos de educação, saúde e segurança.
Sem perceber que a verdadeira questão é como você transforma em problema algo que a população não percebeu ainda como problema.
Liderar é isso. Você abre um caminho. A pesquisa é útil não para você repetir o que ela disse, mas para tentar influenciar o comportamento a partir de seus valores.
O que nós temos na campanha é a reafirmação dos clichês colhidos nas pesquisas. Onde é que está a liderança política, que é justamente você propor valor novo. O líder muda, não segue.

A polarização nacional entre PT e PSDB completou 16 anos. Tem feito mais bem ou mais mal ao Brasil?
O que o Chile fez na forma da Concertação [aliança entre Partido Socialista e Democracia Cristã que governou o país de 1990 a 2010], fizemos aqui sob a forma de oposição. Há muito mais continuidade que quebra. O pessoal do PT aderiu grosso modo ao caminho aberto por nós. Isso é que deu crescimento ao Brasil.
Agora tem aí o começo de um rumo que não é mesmo o meu, que é esse mais burocrático-sindical-industrial. E tem uma diferença na concepção da democracia.

O que seria essa social-democracia tucana?
Social-democracia, vamos devagar com o ardor. O sujeito da social-democracia européia eram a classe trabalhadora e os sindicatos. Aqui são os pobres. O Lula deixou de falar em trabalhador para falar em pobre. Mudou. Nós descobrimos uma tecnologia de lidar com a pobreza, mas estamos por enquanto mitigando a pobreza.
Tem de transformar o pré-sal em neurônio. Esse é o saldo para uma sociedade desenvolvida. Está se perfilando, no PT e adjacências, uma predominância do olhar do Estado, como se o Estado fosse a solução das coisas.

Então a diferença entre PT e PSDB, para o sr., se dá em relação ao papel do Estado.
A nossa tradição é de corporativismo estatizante, e isso está voltando. É uma mistura fina, uma mistura de Getúlio, Geisel e Lula. O Lula é mais complicado que isso, porque é isso e o contrário disso. Como é a metamorfose ambulante, faz a mediação de tudo com tudo. Lula sempre faz a mediação para que o setor privado não seja sufocado completamente. Não sei como Dilma vai proceder.

Isso tende a se aprofundar nesse novo governo?
A segunda parte do segundo mandato de Lula foi assim. A crise global deu a desculpa para o Estado gastar mais. E o pobre do [John Maynard] Keynes pagou o preço. Tudo é Keynes. Investimento não cresceu, gasto público se expandiu, foi Keynes.
Não acho que o Brasil vá no sentido da Venezuela porque a nossa sociedade é mais forte. Aqui há empresas, imprensa, universidades, igrejas, uma sociedade civil maior, mais forte. Isso leva o governo a ter cautela. Veja o discurso da Dilma de ontem [domingo]. Ela beijou a cruz. Ela tem que dizer isso, que vai respeitar a democracia, porque senão não governa.

O que esperar de Dilma?
Não sabemos o que ela pensa, nem como é que ela faz. O Brasil deu um cheque em branco para a Dilma. Vamos ver o que vai acontecer com a conjuntura econômica. Há um problema complicado na balança de pagamentos, um déficit crescente, uma taxa de juros elevada e uma taxa de câmbio cruel.

link para entrevista aqui


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